Nota de Leitura por José do Carmo Francisco

UMA MEMÓRIA DE PEREIROS

Com edição da Padrões Culturais, capa de Mário Andrade e apoio da Associação Amigos de Pereiros estas 150 páginas são 14 crónicas de revisitação («Nasci nos Pereiros e ali vivi até aos doze anos») e daí o seu subtítulo – «Quotidianos de uma aldeia do Alto Douro 1930-1980»). A geografia sentimental é vasta: «A fonte da aldeia, aa azenha ou lagar do azeite e o forno, tal como a igreja, as capelas, o cemitério, as tabernas, os sotos quando vendiam tecidos, a escola do Combro e as salas de aula que precederam esta, se alguém ainda as conseguir identificar, os velhos caminhos, o rio e os seus açudes e pontes, o moinho da tia Elisa, o caminho de Valongo mas ainda do lado de cá do rio, tudo isto constituiu a memória colectiva dos Pereiros». O Mundo começa na paisagem («As árvores da minha terra são os sobreiros, embora uma ou outra oliveira de tronco  carcomido pelos anos possa figurar em segundo lugar») e acaba no povoamentos: «Nos Pereiros ao pedreiro, ao carpinteiro, ao ferreiro, ao ferrador e ao sapateiro chamavam-se artistas». Ficamos pela crónica sobre a carreira diária: «Mais do que o seu percurso entre a Meda e o Pinhão, a carreira era para nós a velha camioneta que vinha todos os dias e nos ligava pela EN 222 à Vila, ao Comboio e ao Mundo. A carreira da Meda ou a Carreira da Viúva passava todas as manhãs, pelas oito e trinta minutos, a caminho do Pinhão e regressava às quatro e meia da tarde. Mostrar-se na Avenida para ver passar aa carreira constituía a actividade social mais importante da gente da Vila e não vestir a melhor roupa  para solenizar esse momento podia desqualificar um cidadão. Nesse curto intervalo desfilavam pela Avenida funcionários, artistas, comerciantes, desocupados, donas de casa virtuosas e meninas casadoiras, bisbilhotando quem tinha chegado e imaginando o destino de quem seguia, assim alimentando o o seu imaginário de residentes desta pequena Vila do interior onde nada se passava desde os tempos do senhor Marquês de Pombal e da criação da Real Companhia Velha».  JCF


Leave a comment