
My hero never wore a cape and never sought applause. Her gaze could cut through fog and foolishness alike. Avó Leonor sat with me for countless hours in the patio of our home in Canada dos Pastos, Praia da Vitória, where the cows murmured from distant fields and the air clung to our skin with the breath of the island. The stones beneath our feet sweated with memory, and the mist rolled in like an old thought we never forgot.
She carried the sea in her bones—its silence, rhythm, and sudden strength. She knew how to read the sky and sense the wind’s turn before the clouds began to gather. She taught me that necessity was a sharper teacher than comfort, and that living with less did not mean living without. She gave without counting—half a fig, a memory, a lesson wrapped in quiet. Her words were strong – they never wavered.
Avó Leonor was not soft. She was steady. Her voice sliced through nonsense like a knife through bread, and her eyes could settle storms. She didn’t speak of dreams—she moved inside them. She wove hope into the hems of every day, into sheets hung beneath grey skies, into a pot of soup when the cupboard was nearly bare.
Terceira’s warm breath clung to her skin but never softened her edge. She was kindness, wrapped in basalt, laughter with a spine of stone. She greeted the mist like an old companion and always had an answer, even if she gave it through a glance, a pause, or the long, measured folding of her apron.
She taught me about love, not the kind that shouts or shines, but the type that remembers birthdays without calendars and saves the last slice of bread without showing it. She taught me faith, not only in saints and rosaries, but in rising each day with dignity and clean hands. She taught me hope—not the noisy, public kind, but the quiet one that waits in gardens, speaks in glances, and walks barefoot.
She never left her homeland—not once. Her feet never touched foreign soil. But she was a woman of the world. Her thoughts sailed past the waves, and her wisdom outlasted time zones. She knew things no book could teach—how to carry grief without bitterness, speak truth without cruelty, and live fully inside the boundaries of a small stone house with a wide-open heart.
And although she never traveled and is now gone, she lives and travels through me. She walks continents in my breath. She sails the marrow of my bones. She rises in my spine when I resist and say no, and stands still in the storm, when I don’t flinch.
She is the salt in my voice, the fig in my memory, the lace in my hands. I am her vessel, and wherever I go, avó Leonor goes too—quietly, fiercely, like wind threading through mist.
A Avó Leonor (na Bruma da Canada dos Pastos)
A minha heroína nunca usou uma capa e nunca procurou aplausos. O seu olhar era capaz de atravessar tanto a neblina como as absurdidades. A avó Leonor sentava-se comigo durante horas a fio no pátio da nossa casa na Canada dos Pastos, Praia da Vitória, onde as vacas mugiam nos campos e o ar agarrava-se à nossa pele com o hálito da ilha. As pedras sob os nossos pés suavam com a memória, e a bruma rolava como um pensamento antigo que jamais esqueceremos.
A avó Leonor carregava o mar nos ossos — no seu silêncio, no seu ritmo e na sua força repentina. Sabia ler o céu e sentir a mudança do vento antes que as nuvens começassem a formar-se. Ensinou-me que a necessidade era uma professora mais severa do que o conforto e que viver com menos não significava viver sem nada. Ela dava sem olhar — metade de um figo, uma memória, uma lição embrulhada em silêncio. As suas palavras eram fortes — nunca vacilavam.
A avó Leonor não era uma mulher maleável. Era firme. A sua voz cortava o absurdo como uma faca corta o pão, e os seus olhos podiam acalmar todas as tempestades. Não falava de sonhos — vivia dentro deles. Tecia esperança nas bainhas de cada dia, nos lençóis pendurados sob o céu cinzento, numa panela de sopa quando o armário nem sempre estava cheio.
O hálito quente da Terceira agarrava-se à sua pele, mas nunca mitigava a sua consistência. Ela era bondade, envolta em basalto, risos com uma espinha dorsal de pedra. Cumprimentava a bruma como uma antiga companheira e tinha sempre uma resposta, mesmo que fosse através de um olhar, uma pausa ou o dobrar longo e medido do seu avental.
A avó Leonor deu-me muitas lições sobre amor, não aquele que grita ou brilha, mas o que se lembra dos aniversários sem necessitar de calendários e guarda a última fatia de pão sem fazer alardes. Ensinou-me a fé, não apenas nos santos e nos rosários, mas no acordar todos os dias com dignidade e com as mãos limpas. Ensinou-me a esperança — não aquela barulhenta e pública, mas a silenciosa que espera nos jardins, fala através dos olhares e anda descalça.
Ela nunca saiu da sua terra, nem uma única vez. Os seus pés nunca tocaram solo estrangeiro. Mas era uma mulher do mundo. Os seus pensamentos navegavam pelas ondas e a sua sabedoria ultrapassava os fusos horários. Sabia coisas que nenhum livro poderia ensinar: como carregar a dor sem amargura, falar a verdade sem crueldade e viver plenamente dentro dos limites de uma pequena casa de pedra com o coração aberto.
E embora nunca tenha viajado e como já não está (há demasiado tempo) fisicamente entre nós, ela vive e viaja comigo. Caminha por continentes na minha respiração. Navega na medula dos meus ossos. Ergue-se na minha coluna quando resisto às injustiças deste mundo e permanece imóvel na tempestade, quando não recuo.
A avó Leonor é o sal na minha voz, o figo na minha memória, a firmeza nas minhas mãos. Eu sou o seu recetáculo e, para onde quer que eu vá, a avó Leonor também vai — silenciosamente, ferozmente, como o vento a atravessar a bruma.
