Por Dentro do Mundo, a Palavra: Nos 80 anos de Álamo Oliveira, uma celebração da escrita que nos humaniza

Quando um poeta dedica um poema a outro, como faz Ivo Machado ao homenagear Álamo Oliveira, estabelece-se um diálogo poético que transcende a admiração pessoal: é o reconhecimento da importância literária e afetiva do homenageado. Nesse gesto, há cumplicidade estética e afetiva, e o poema torna-se não apenas tributo, mas também espelho da amizade, da partilha de origens e da consciência de pertencimento comum — neste caso, ao arquipélago dos Açores e à literatura insular.

DESTES PÁSSAROS

ao Álamo Oliveira

há que dizer destes pássaros

sem nomear

destes pássaros em bando

um ou outro isolado

chegam com demora e pousam

nas dunas celebrando

os homens oficiam os solstícios

enquanto eles concitam com suas práticas

seus ritos

os grandes

sendo machos embevecidos dançam no anil sem limites

os pequenos

pelas mães entretidos perdem-se nos verdes a aparecer

sem urgência.

há que dizer

desta celebração

destes pássaros em bando

animando a lua da transmutação

quando tudo se renova se enfeita

apenas nós parecemos iguais

sérios como o calendário

demorado

nunca falo deles sem comoção por dizer

pois são a razão do canto a chegar

no despertar das dunas

saibam meus filhos ler

estes sinais

no registo dos dias diferentes

apenas isso bastará.

IVO MACHADO

In, “Adágios de Benquerença” (2001)

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