De que falamos nós quando falamos sobre pseudónimos?
Do grego pseudónymos, pseudónimo significa nome sob o qual alguns escritores
optam por publicar as suas obras omitindo a sua verdadeira identidade, subscrevendo-as com um nome que não é o seu.
Ao longo dos séculos, muitos escritores adotaram pseudónimos por diversas
razões, sendo que vários pseudónimos se tornaram tão famosos que, para muitos, são
mais reconhecíveis do que os nomes reais dos autores. Por exemplo e entre muitos
outros: Voltaire (1694-1910), que se chamava François-Marie Arouet; Lewis Carroll
(1832-1898), nascido com o nome de Charles Lutwidge Dodgson; Mark Twain (1835-
1910), cujo nome verdadeiro era Samuel Langhorne Clemens; George Orwell (1903-
1950), que se chamava Eric Arthur Blair; Pablo Neruda (1904-1973), nascido com o
nome de Ricardo Eliécer Neftali Reyes Basoalto.
Perguntar-se-á: quais os motivos que levam um autor a omitir a sua verdadeira
identidade? Tal escolha terá sempre razões que revelam muito da sua personalidade.

I
Universo masculino
A literatura portuguesa regista a existência de não poucos escritores que
recorreram a pseudónimos: Elmano Sadino, que dava pelo nome de Manuel Maria
Barbosa du Bocage (1765-1805); Almeida Garrett que foi batizado com o nome de João
Baptista da Silva Leitão (1799-1855); Júlio Dinis, que se chamava Joaquim Guilherme
Gomes Coelho (1839-1871); Teixeira de Pascoaes, cujo nome real era Joaquim Pereira
Teixeira de Vasconcelos (1877-1952); José Régio, que era, na verdade, José Maria dos
Reis Pereira (1901-1964); António Gedeão, com nome de batismo de Rómulo Vasco da
Gama de Carvalho (1906-1997); Miguel Torga, cujo verdadeiro nome era Adolfo Correia
da Rocha (1907-1995); Eugénio de Andrade, com nome próprio de José Fontinhas
(1923-2004), entre outros.
Nas Letras Açorianas destaco alguns escritores que escolheram os seguintes
pseudónimos:
Francisco Joaquim Moniz de Bettencourt (1847-1905), Mendo Bem.
Florêncio Terra (1858-1941), Ri…Cardo, X, XXX, Y, Máscara Verde, Nemo,
Zague e Ignotus.
Gervásio Lima (1876-1945), João Azul, João do Outeiro e Thomé da Eira.
Armando Côrtes-Rodrigues (1891-1971), Violante de Cisneiros.
Francisco Luís de Mello (1895-1961), João Locução.
Frederico Augusto Lopes da Silva Júnior (1896-1979), João Ilhéu.
Luís Filipe Botelho de Gusmão Côrtes-Rodrigues (1914-1991), Ribeira Sêca.
José Guilherme Macedo Fernandes (1939-2011), André Moa.
Santos Barros (1944-1983), Ricardo Ascensão, M.N. Duarte, A.J. Peixoto, A.
Espírito Santo.
Rui de Mendonça (1959- ), Jayme Velho.
Curioso será verificar que muitos dos autores que passaram pelas fileiras dos
Seminários, recorreram a pseudónimos na sua produção escrita, certamente pela
necessidade de separar as águas entre religião e poesia que, em tempos pretéritos,
poderiam ser irreconciliáveis. Alguns exemplos:
Frei Alexandre da Sagrada Família (1737-1818), Sílvio.
António José Jacinto Botelho (1876-1946), António Moreno.
José Luís de Fraga (1901-1968), Valério Florense.
José Enes Pereira Cardoso (1928-2013), António Mar.
Artur Cunha de Oliveira (1924-2018), Silva Grelo e Klaus-Kaffa Gil.
Daniel de Sá (1944-2013), Augusto da Vera Cruz.
Fernando Reis Júnior (1946-2012), Rex.
Onésimo Teotónio Almeida (1946- ), Sivnório e Vaxezy.
Eduardo Jorge Brum (1954- ), Vital Ferrão.

II
Universo feminino
Numa época em que o papel feminino era relegado à esfera doméstica, algumas
das maiores escritoras recorreram a pseudónimos masculinos para conseguir publicar as
suas obras. Foi o caso, em Portugal, da escritora Irene Lisboa (1892-1958), que recorreu
ao pseudónimo João Falco. E, nesta matéria, temos bastos exemplos “lá de fora”:
Amandine Lucile Aurore Dupin de Francuel (1804-1876), que usou o pseudónimo George
Sand; as irmãs Brontë, Charlotte (1816-1855), Emily (1818-1848) e Anne (1820-1849),
que utilizaram os pseudónimos masculinos Currer, Ellis e Acton Bell: e ainda Mary Ann
Evans (1819-1880) que usou George Eliot como pseudónimo.
Outra conhecida autora que mudou o nome para se diferenciar da sua obra mais
conhecida foi Agatha Christie (1890-1976). A “rainha do crime”, que ficou famosa pelas
séries de livros dos detetives Hercule Poirot e Miss Jane Marple, empregou o pseudónimo
Mary Westmacott para escrever e publicar romances e peças de teatro.
Temos ainda os casos de dois autores best sellers. Antes de ser escritor aclamado,
Stephen King (1947- ), o “rei do horror”, usou o pseudónimo Richard Bachman porque
não gostava do seu verdadeiro nome; depois de ter alcançado fama e glória com os seus
sete romances Harry Potter, Joan Kathleen Rowling (1965- ) usou o pseudónimo
masculino Robert Galbraith para publicar romances policiais.
No contexto açoriano, temos os seguintes nomes:
Silvina Furtado de Sousa (1877-1973), Iracema.
Humberta Borges de Ávila e Azevedo (1900-1980), Mariavelar.
Maria Francisca Bettencourt (1904-1980), Maria do Céu.
Maria Angelina de Sousa (1907-1987), Turlu.
Francisca Sousa da Silva (1950- ), Chica Ilhéu.
Maria Armandina das Neves Andrade (1954- ), Ana Leite.
Rosa Maria Correia da Silva (1964- ), Azoriana.
Carla de Fátima Borges Valadão (1981- ), Válida.

III
Que razões para o uso de pseudónimos?
Um(a) autor(a) pode ter uma vida profissional noutra área e enveredar pelo
universo das letras, recorrendo a um pseudónimo que lhe garanta total liberdade e o
indispensável anonimato. Ou pode pretender homenagear alguém (um familiar, um amigo)
ou alguma coisa (o nome da sua terra natal, por exemplo).
Descortinar as razões que fundamentam esta opção nem sempre é fácil. Contudo,
é sempre possível especular sobre as inúmeras possibilidades que podem ser colocadas.
No contexto açoriano, avancemos com algumas possíveis razões:
- Separação de identidades de escrita, o que permite que os autores estabeleçam
diferentes identidades literárias. Exemplos: Florêncio Terra, Gervásio Lima, Armando
Côrtes-Rodrigues, António José Jacinto Botelho, José Luís de Fraga, José Enes
Pereira Cardoso, Artur Cunha de Oliveira, entre outros. - Liberdade criativa, que liberta os autores de expectativas e pressões associada ao seu nome real, permitindo-lhes experimentar mais livremente estilos e temas. Exemplos:
Frederico Augusto Lopes da Silva Júnior, Daniel de Sá, Onésimo Teotónio Almeida,
Santos Barros, Eduardo Jorge Brum, entre outros. - Questões de género e preconceito, num tempo em que a escrita no feminino não era
vista com bons olhos pelos valores conservadores do patriarcado, e disso foram “vítimas” Silvina Furtado de Sousa, Humberta Borges de Ávila e Azevedo e Maria Francisca
Bettencourt. - Legado familiar, de que é exemplo paradigmático o médico/escritor Rui de Mendonça, que utiliza o pseudónimo Jayme Velho para homenagear o seu avô Rui de Mendonça (1896-1958), professor, escritor e jornalista, que utilizou aquele mesmo pseudónimo.
Concluindo: escolher um pseudónimo é uma decisão profundamente pessoal e
estratégica. Quando bem escolhido e se bem gerido, um pseudónimo pode ser uma
ferramenta poderosa para expandir a liberdade de expressão e inovação literária.

Victor Rui Dores, poeta, romancista, ensaísta, crítico literário e dramaturgo.
