Na capital portuguesa-dois livros

Hoje em Lisboa pelas 16h30, hora local. Dois livros da editora Poets and Dragons.

Há livros que se lêem e há livros que nos lêem. FACA:, de Luís Filipe Sarmento, é um desses raros espécimes literários que não apenas habitam as prateleiras, mas também atravessam o leitor, como uma lâmina afiada rasgando as camadas de nossa própria existência. O título, aparentemente simples e contundente, já é uma pista do que está por vir: a faca é um objeto de precisão, um instrumento tanto de criação quanto de destruição, capaz de separar e unir, de dilacerar e dissecar. Neste livro, Sarmento utiliza a faca não apenas como uma metáfora, mas como um símbolo de uma busca incessante — a busca pelo eu, pela identidade, pela fuga e, acima de tudo, pelo significado. FACA: é um convite à reflexão. Um convite perigoso, pois não oferece respostas. Sarmento não é um autor que tranquiliza o leitor com verdades fáceis. Pelo contrário, ele empurra-nos para o abismo, forçando-nos a confrontar as nossas próprias máscaras, as nossas próprias fugas. A leitura deste livro é uma experiência inquietante, onde cada linha é uma lâmina que nos desvela e expõe. E, ao chegar ao final, resta apenas a sensação de que, tal como Fúlvio, também nós fomos transformados — não pela liberdade que buscamos, mas pelo corte da realidade que nos atravessa. (Da editora)

Neste Auto-retrato enquanto Hamlet, D. H. Machado constrói uma obra que nos leva, de maneira quase implacável, ao terreno mais sombrio da introspecção humana. Este livro não é sobre a acção, mas sobre a pausa, sobre o intervalo entre as coisas. A escrita é delicada, cheia de nuances, e há uma coragem em deixar que as palavras flutuem, como se fossem pedaços de diálogos inacabados, perdidos num espaço onde o passado ainda ecoa. O autor desenha um mundo onde as personagens — especialmente o protagonista e Ophelia — parecem mais fantasmas de si mesmos do que figuras de carne e osso. A estrutura fragmentária do livro, com os seus longos silêncios e intervalos entre as palavras, remete-nos ao estilo mais moderno, onde o espaço em branco é tão importante quanto o texto escrito. Tudo se passa no limiar da realidade, numa espécie de sonho acordado, levando o leitor a deleitar-se com a musicalidade da linguagem, com os detalhes, com os gestos mínimos, como quem explora uma casa antiga onde os ecos das conversas se arrastam pelas paredes. O que D. H. Machado faz aqui é um exercício de contenção e intensidade. E é nessa tensão que reside a força de Auto-Retrato Enquanto Hamlet, um texto profundamente contemporâneo e, paradoxalmente, atemporal. (da editora)

Fotografias do evento em Lisboa (fotos da página do Facebook do poeta Luís Filipe Sarmento)

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